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01 SET 2018
Rumo à morte?
Por Jornal Abarca

A onda vertiginosa de calor atacou, tal como aconteceu em anos anteriores, ainda é cedo para contabilizarmos os seus efeitos nos principais eleitos para morrerem antes do tempo, como se existisse um tempo certo, preciso, como barreira intransponível marcante da finitude das nossas vidas.

Os especialistas da «vida» carregam o horizonte de negro dadas as negritudes (não estou a referir-me à raça) provocadas pelo homem desde a revolução industrial (pelo menos) no tocante à preservação do ambiente, todavia esse mesmo homem alicerça o progresso técnico através do sistemático recurso à ciência.

Neste mês de Agosto, tal como noutros anos, os referidos especialistas inundaram os noticiários de predições catastrofistas, segundo os seus doutos pareceres dentro de poucos anos os Estios tórridos vão torrar milhões dos sobreviventes aos Invernos polares, Outonos eivados de furações e tufões, Primaveras chuvosas e ventosas. O cidadão interroga-se, alguns correm a ler os calhamaços de profecias, outros suavizam as angústias escorando-as no fiasco milenarista do ano 1000, porém, tão horríveis presságios causam um profundo mal-estar a quem procura cumprir as suas obrigações, até as mais parvas e extravagantes. E, pergunta: então os governantes não se entendem em tudo quanto possa denegrir o nosso viver? Então os senhores do mando são suicidas? Então estamos condenados à maldição não sendo malditos?

Podia multiplicar as interrogações, é supérfulo. Há dezenas de anos cientistas do calibre de Dumont ou Josué de Castro erguiam bandeiras declarando a falta de alimentos como o mais tenebroso problema do Planeta, os seus alertas são elogiáveis, contribuíram para ajudar muitos milhões de pessoas, no entanto, nunca houve falta de alimentos, há e continuará a existir profunda injustiça na sua distribuição.

As formulações legislativas abundam, recordam-se da farisaica actividade da ASAE (anda muito discreta), a bombordo e a estibordo mostram-se abomináveis quantidades de lixo nos mares, lagos e rios, todavia as campanhas de sensibilização pouco rendem no ataque ao óbvio, e volto a perguntar: o que faz de concreto (concretamente) o poder? Não sabemos.

O rio Tejo minga no mês de todas as festas, se assim continuarmos teremos procissões de defuntos em catadupa, sempre abrilhantadas por espectros risonhos grávidos de vestígios de espécies piscícolas desaparecidas como desapareceu o esturjão. E, neste ponto da crónica interrogo-me a mim mesmo: estás a ficar lamechas, com medo da morte? Detesto a lamechice, a morte é certa. Procuro não balouçar entre o dormir a sono solto, dar enorme desconto aos anunciantes do caos, e o ingressar numa comunidade de eremitas alimentados a água, ervas campestres e meditação. Ser sibarita é sinónimo de bom gosto, o das pessoas cujas carteiras estão grávidas de cartões recheados de crédito, ser ermita despojado da vontade em praticar os sete pecados capitais. O sibarita é feliz até chegarem as mazelas decorrentes da opção tomada rumo à morte estilo filme Grande Farra, o mastigador de raízes, caules, rebentos e fruta silvestre, o ermita, meditabundo esperançado numa existência digna de Matusalém, fenece numa situação de estorvo aos seus e ao SNS. Os sibaritas rendem grossos lucros às clínicas de sucesso garantido aos cangalheiros do jet-set, os ermitas mantêm em pujante acção as agências funerárias locais. Estamos tramados!

Venha o dilúvio. Espero conseguir lugar na Arca de Noé. Porque a cidade de Ulisses será das primeiras a ficar submersa desaparecem os aleijões pintados a negro na Casa de Robles, se o Noé oferecer em passeio turístico contemplar a Cidade submersa enquanto saboreio maçãs camoesas de Abrantes que levo no bornal, adequadas por causa das ninfas (maças de Hespérides), para no dia da acostagem da Arca ler Manhã Submersa de Vergílio Ferreira rendendo-lhe merecido tributo pois em Para Sempre ensina a entrarmos serenamente no reino da Senhora da gadanha. Se não podemos fugir, sigamos lúcidos e serenos. Eu continuo a gostar de viver.

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