Quem tem paciência para ler as palavras que por aqui vou rabiscando já percebeu que, inequivocamente, ignoro o “novo acordo ortográfico”. Para mim o Verão continua a ser aquela estação do ano que tem sol, calor e férias. Férias de Verão e não de verão. Ou será que deverão e eu deveria?
Ainda sou do tempo que as férias de Verão tinham a duração de quase quatro meses e em Setembro estava ansiosa por regressar às aulas. Já tinha saudades.
Férias de Verão representava a amizade. Amizade solta e genuína. Grupos de amigos na minha casa, na minha rua, nas piscinas do Campo Militar de Santa Margarida e na praia. Fui uma privilegiada pois cresci rodeada de amigos. Amigos e livros. Líamos e trocávamos livros nas férias de Verão.
Ao ler a entrevista que George Steiner deu ao jornal “Expresso” há cerca de duas semanas, recordei palavras suas dadas numa outra entrevista ao jornal “El País” e nas quais mostrava uma preocupação pelo crescente desprezo pelas humanidades. Referia que o seu instinto que lhe dizia que no futuro não teríamos um novo Shakespeare, Beethoven, Michelangelo, Dantes ou Cervantes, mas teríamos um novo Newton, Einstein ou Darwin. Recordei a sua inquietude porque é um tema no qual reflicto com regularidade e me provoca, igualmente, preocupação. Como será a cultura desprovida de grandes obras estéticas?
Ouço frequentemente desabafos de adultos que ficam incomodados com a destreza dos indicadores e polegares dos jovens e lisonjeados com as suas crianças “que até já sabem mexer nos comandos todos”. Atendendo a que estes adultos no Verão lêem “facebook”, como posso ainda reparar “nesta normalidade”? Posso estar errada e até podem pedir apoio a Pessoa:
“Ai que prazer
Não cumprir um dever
Ter um livro para ler
E não fazer!
Ler é uma maçada …”
A importância da leitura não precisa de justificação porque não pode haver cultura alfabetizada sem passar pela base da civilização. Li algures que Álvaro Cunhal começou a traduzir o “Rei Lear” na prisão. Mais tarde, aos 80 anos e meio cego terá completado a tradução.
Não precisamos de ler e traduzir os clássicos. Não precisamos de vestir arrogância. Mas ler “facebook” e educar jovens nas redes sociais é ambicionar um futuro “muito pequenino”. E já se vão vendo os resultados parecendo até que não aprendemos nada com a História.