A guerra acabou, mas prolonga-se no cérebro de quem a viveu. Por muitos anos, talvez todos os anos que ainda vai viver.

 

No mês que agora findou várias iniciativas e comemorações públicas recordaram, numa evocação já distanciada por um século inteiro, a profunda ferida que foi a batalha de La Lys, uma extensa frente de combate que se traduziu num desastre do corpo expedicionário português, a maior desgraça, segundo os peritos militares, depois da aventura sebastiânica por terras de Alcácer-Quibir. (...)

 

É a outra maldade das guerras. Sofre-se nelas, e sofre-se quando já acabaram, feridas sem chagas, sem estilhaços, uma guerra que nem lugar tem para heróis nem heroísmos. Dores invisíveis, dores dos sons de balas que não existem, cheiros de uma selva que está muito longe, recordações a que se dá o nome clínico de Perturbação de Stress Pós Traumático (PTSD, no seu acrónimo anglófono) ou, com maior frequência, stress de guerra. São dores da memória, a forma crónica e traumática que as guerras encontraram para nunca acabarem, como se também tivessem instinto de sobrevivência. (...)

 

“Para as mulheres a guerra começa quando a guerra acabou. É nesta altura, quando os conflitos bélicos terminaram e eles chegam a casa que começam o problemas, pois o homem que chega não é o mesmo…”, observa António Correia. “Por parte dos homens há agora uma relação de desapego e mesmo de afastamento, e por parte das mulheres, uma preocupação de repor a estabilidade na família”, acrescenta.

 

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