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01 JUL 2018
Populares
Por Jornal Abarca

São três – António, João e Pedro – Santos de todos, a concederem nome a numerosos topónimos por esse Mundo fora, que nós portugueses, familiarmente, tratamos tu para cá, tu para lá, por serem mesmo assim: Populares. A toda a hora, a todo o momento, nos doze meses do ano, numa afeição sem barreiras, de sainetes díspares, envolvendo piadas ao Santo casamenteiro quebra bilhas e Doutor da Igreja capaz de resolver num ápice os intricados silogismos aristotélicos, ao Santo João precursor de Jesus Cristo a quem baptizou, além de alvo da cólera da maléfica Herodias instigadora junto de Herodes Antipas da sua decapitação e o Santo Pedro, inicialmente apanhador de peixes, depois pescador de almas e surdo no momento do galo cantar, bom no manejo da espada, heróico no martírio e desde sempre chaveiro das portas do Céu, ali só entra quem o senhor São Pedro entender merecer a distinção.

O leitor faça o favor de desculpar a liberdade acima expendida no tratamento dos Santos populares, além de o serem fazem o favor de sorrirem ante as minhas transposições do protocolo, a aldeia onde fui feliz o seu padroeiro é o Santo das chaves, na meninice ajudei a construir inúmeras cascatas em honra do Santo cuja carreira militar acabou no posto de General do Exército, além de ser venerado em Pádua e em Roma, por cá ao exemplo dos seus companheiros em popularidade concede relevância e lustra dezenas de topónimos por todo o terrunho português; três exemplos – Santo António dos Cavaleiros, Santo António de Lisboa, Vila Real de Santo António –, sim S. João e São Pedro ganham nesta compita, a provarem quão é abrangente, profunda e secular a união com o povo português. Se S. João concede nome a S. João da Ribeira e o seu contrário – Ribeira de S. João – São Pedro é da Cadeira no concelho de Torres Vedras, do Sul no Distrito de Viseu, dos Serracenos, no concelho de Bragança. Pela amostra os leitores perceberão a justeza do cognome de Populares, apesar de outros Santos o serem, só que, por uma qualquer razão não conseguem atingir o seu estatuto, perdoem a ousadia, o popular Presidente Marcelo é pulverizado no confronto. Ao mortal Marcelo até o benquisto carpinteiro José ganha. Sim, as comparações são odiosas, estas podem ferir a susceptibilidade das pessoas ortodoxas, não é a intenção, é sim, a de demonstrar quão grata está a grande maioria do povo português porque ao longo de séculos e séculos eles têm ouvido nus e suplicantes, humilhados e ofendidos, desamparados e pobres de pedir, consolando-os e, no entendimento de muitos, realizado milagres como o comprovam ex-votos existentes em igrejas e capelas, ainda de forma bem visível o pagamento de promessas por parte dos pagadores.

Nas festividades em sua honra vibram os instrumentos musicais agora ampliados tecnologicamente, cantam as gargantas, batem os pés em sapateados (felizmente já desapareceram os pisares quotidianos dos pés descalços), levantam-se os braços de forma a os sovacos respirarem, come-se e bebe-se ao desafio e à desgarrada. É o tempo de reinar a sardinha assada. Apesar de a popular sardinha imperar, quer seja pelo custo elevado a desmentir os idos de outrora, quer porque entrou na quota das espécies a proteger, este ano no castiço (já foi mais) Bairro da Mouraria é o carapau a substitui-la. Pode parecer mentira, porém é verdade.

Os Santos populares ultrapassam em vigência o mês de Junho, por isso mesmo ouso dar-lhe simples e prosaico afago no número deste mês de A Barca. Cada edição do jornal permanece na casa das pessoas até à chegada de novo número, daí acreditar no entendimento de quem gasta os olhos a ler os meus escritos das razões deste.

Boas sardinhadas e bom vinho (no duplo sentido) desejo aos estimados leitores. Também há apreciadores de sangrias! Os Santos são indulgentes, os anos passam, o progresso leva à adopção de novos usos e usanças, mesmo tocante a beber a acompanharem pitanças de cariz tradicional. O famoso e recém-falecido Anthony Bourdain, bom conhecedor da cozinha portuguesa, nas suas andanças em busca dessa ancestral cozinha de todos os povos comeu ovos de formiga no México, testículos crus de carneiro em Marrocos, escorpiões fritos na China, e por aí adiante. No entanto, era exímio chefe das clássicas cozeduras e suas múltiplas variantes, mesuras e ataviamentos. No Porto apreciou costeletas de sardinha alhos-porros na moleirinha.

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