Há quem não perca um jantar, há quem apareça de quando em vez e há sempre alguém que se “estreia” para rever os amigos e reviver a infância ou adolescência vividas no Tramagal. O jantar anual da comunidade tramagalense residente na grande Lisboa é sempre uma festa
Se é verdade que a memória pode ser uma prisão, se olhar para trás pode raiar o revivalismo, não é menos verdade que cada um revive com prazer as aventuras e tropelias dos anos em que os dias eram enormes e os anos demoravam eternidades. Este é o espírito que preside ao jantar anual dos tramagalenses residentes na grande Lisboa. O Tramagal já não é o que era, situação comum a qualquer lugar, mas tem a particularidade dos seus naturais ou adoptivos sentirem orgulho da sua terra.
“Nunca faltei a um jantar. É uma forma de aproximar as pessoas”, confessava Maria Luísa Filipe, na sexta-feira, dia 27 de Novembro, data do VIII jantar tramagalense que este ano juntou cerca de sete dezenas de convivas no restaurante Páteo, na R. do Açúcar, em Lisboa.
Luísa Filipe saiu do Tramagal em 1970, com 18 anos para ir estudar para Lisboa. Deu aulas em diversos locais, trabalhou na Metalúrgica Duarte Ferreira durante seis meses e voltou a sair para ingressar na EDP. “Faço 30 anos de EDP”. Vem regularmente ao Tramagal, para visitar os pais - “sou fi lha do Augusto do talho” – mas prefere ficar em casa a ir ao café.
Nascida por acidente em Lisboa, Catarina Avelar, figura bem conhecida dos palcos nacionais, assume-se como
tramagalense de alma e coração e sempre que pode não perde um jantar. “Foi no Tramagal que vivi é lá que tenho as minhas raízes” e foi também no Tramagal que começou a sentir o gosto pelo teatro. “Os meus tios da parte da mãe e da parte do pai estavam ligados ao teatro amador. O meu pai também”. Mas Catarina era uma menina muito tímida e “nunca” lhe passou pela cabeça enveredar por uma carreira de actriz.
A récita de um poema num espectáculo e a influência de Maria Bastos Duarte Ferreira ditaram-lhe a profissão. “Naquele tempo, a alguém da família Duarte Ferreira ninguém dizia que não, a Sra. D. Maria Bastos pediu ao meu pai para ir vir estudar teatro para Lisboa, vinha para casa dela, ela responsabilizava-se por mim e o meu pai acedeu”.
Naturalmente algumas das peças representadas por Catarina Avelar e transmitidas pela RTP tinham atrás de uma das câmaras um outro tramagalense: Manito de Almeida. Este ano, o homem com uma longa história de cameraman, quando as máquinas pesavam “toneladas” e a emissão eram interrompida por intermináveis e frequentes “interlúdios” ou por um “pedimos desculpa por esta interrupção, a emissão segue dentro de momentos” foi outra das presenças do jantar de 2009. Promete vir em breve ao Tramagal e contar ao Abarca as suas aventuras. Ainda por cima ele que gosta de conversar.
“Quando vejo a placa a indicar Tramagal é uma alegria imensa”, dizia Francisco Branco, acrescentando: “Nunca digo que sou de Abrantes, digo sempre que sou do Tramagal, é um orgulho que tenho”.
Pela primeira vez, o presidente da junta de Freguesia de Tramagal esteve num jantar da comunidade tramagalense residente na grande Lisboa. “Vi pessoas que não via há muito tempo e senti a alegria dos tramagalenses em Lisboa. Este jantar deve continuar e quero dar os parabéns à comissão”, afirmou Victor Hugo Cardoso, eleito pelo PS nas autárquicas de 11 de Outubro.
A comissão organizadora é eleita por dois anos. Para o anos os responsáveis pelo XIX jantar são Gil Manana, Conceição Quintas, Ana Maria Baião Jerónimo e Luís Vilela.
Um tramagalense em cada esquina
Recentemente, Catarina Avelar apanhou um táxi em Lisboa conduzido por um tramagalense. Um dos empregados do restaurante onde decorreu este ano o jantar da comunidade tramagalense confessou, no decorrer do mesmo, que havia nascido no Tramagal. Segundo Joaquim Paulo Santos são cerca de duzentos os tramagalenses residentes na área da grande Lisboa. Mas há mais comunidades no país, como a da Marinha Grande ou a do Algarve, tal como há emigrantes nascidos na Vila Convívio que buscaram melhores condições de vida nos vários continentes.
“Juntar” esses fi lhos da terra espalhados pelo mundo foi o tema de mais uma sessão do Forum da Cidadania que decorreu no sábado, dia 28 em moldes diferentes dos habituais. No estúdios da Rádio Tágide, a comissão organizadora entrou em contacto com tramagalenses residentes no Canadá, em Angola, em França, Alemanha, Reino Unido, Suíça. A emissão pode ser escutada via internet através do site www.radiotagide.pt.
Em estúdio estiveram Abílio Pombinho, Octávio Oliveira, Joaquim Paulo Santos, Joaquim Ervideira, António José Carvalho, Victor Hugo Cardoso, sendo a emissão dirigida por Mário Rui Fonseca.
Da terra guardam as saudades da família e dos amigos, mas também dos locais onde passaram grande parte das suas vidas. Luís Espadinha, residente em Toronto (Canadá) lamenta não poder vir todos os anos ao Tramagal, mas vai recebendo notícias através do jornal ABARCA.
Luís Horta Ferreira, de 39 anos, pintor de construção civil, saiu do Tramagal em 1977. “Fui à aventura”. Fixou-se no Reino Unido e nos últimos anos na Escócia, mas pensa na sua terra “todos os dias” e defende que o Tramagal devia ter um site na internet que aproximasse a comunidade ausente e funcionasse como um cartaz da vida económica, social, cultural e desportiva do Tramagal.
António José Carvalho, representante da comunidade tramagalense no Algarve é autor do blog tramagal.blogspot.com e comunga da opinião de Horta Ferreira: “A internet permite-nos estar ligados e é uma oportunidade de estreitar ligações. Tem sido uma experiência muito interessante. Começou por ser uma brincadeira, mas no último ano ganhou mais dinamismo”.
Fernando Caldeira e João Calado residem em Luanda mas não têm contacto entre si. Tramagal ficou-lhes no coração, mas dificilmente irão regressar. Também Narcisa Peixoto e João Vitório emigrantes em França, ou António José Tomás, na Alemanha, sentem a falta dos amigos que “nunca mais viram”. As saudades de quem está longe e que, de alguma forma, foi “obrigado” a partir em busca de melhor sorte.