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01 DEZ 2008
ALCÍNO SERRAS: O CHARADISMO PROLONGA A VIDA
Por MARGARIDA TRINCÃO

 

Jogam com as palavras, decifram e criam enigmas complicados. São charadistas. Um grupo de “defensores da Língua Portuguesa”, segundo Alcínio Serras, colaborador de ABARCA e charadista de longa data.

 

Têm nomes estranhos e é assim que se conhecem. Uns utilizam o anagrama dos nomes próprios, outros juntam as primeiras sílabas ou fazem jogos bastante mais complicados. Mas não é só por mero divertimento que o fazem. “Os charadistas conhecem-se todos por pseudónimos, e a razão disto é porque todos se tratam por tu, quer sejam catedráticos, que também os há, quer tenham outra profissão qualquer. Tratam-se pelo pseudónimo e andou”, esclarece Alcínio Serras.

Abrantino, residente em Mouriscas, Alcínio Serras, formado em Sociologia, entrou para o charadismo em 1958, tinha então 24 anos. Conta ele: “A coisa começou assim, o Diário Popular publicou um concurso de palavras cruzadas e eu que estava em Lisboa, resolvi concorrer. Logo no primeiro problema, apareceu-me uma palavra que não descortinei. Corri o dicionário de ponta a ponta. Sabia a primeira letra, mas faltava-me algumas, e não consegui resolver o problema. Na altura, só tinha um dicionário, agora com o material todo que tenho resolvo qualquer problema”. 

Como qualquer charadista, mesmo iniciado, Alcínio Serras não desistiu: “Conhecia a revista ‘O Charadista’ e sabia que os charadistas se reuniam na cave do Café Palladium, nos Restauradores, aos sábados, por volta das 16h00. E lá fui eu. Pedi para ser apresentado a um deles, não me lembro, contei-lhe o que me tinha acontecido e ele deu-me logo a solução: hemeroteca (secção das bibliotecas de jornais e de revistas). Nessa altura, foi convidado para ser sócio dos charadistas e passei a ir todos os sábados ao Palladium”.

De charadas, a maioria conhece as palavras cruzadas, mas há muito mais problemas, alguns deles verdadeiramente complexos. O que é que é o charadismo? É um jogo da língua?

“É tudo um jogo da língua. Uma charada, se reparar não há nenhuma mal escrita, vêm todas em Português correcto, porque é proibido no charadismo dar-se erros. É uma defesa da Língua Portuguesa. Mas também é um jogo e é preciso saber-se para jogar. Para resolvermos as palavras cruzadas que, às vezes, são publicadas em Abarca, temos que interpretar o espírito do autor. Por exemplo, nestas onde se diz ‘era português e circulava na Índia’, deve ser uma moeda”.

Os encontros no Palladium, há muito que acabaram, mas a revista “O Charadista” continua a publicar-se e já passou o meio milhar de exemplares. Da responsabilidade do órgão oficial “Tertúlia Edípica”, a revista é editada em Lisboa para Portugal e para o Brasil, onde há muitos seguidores.

“Há dois anos, no encontro do Sardoal, estiveram dois casais brasileiros, um de São Paulo outro de Brasília, que vieram de propósito”, recorda Alcínio Serras, ou melhor o charadista Adimas. Os amantes desta arte de desvendar e criar enigmas, fazem um encontro anual e comunicam frequentemente uns com os outros. “Tenho o contacto de quase todos eles. Somos cada vez menos e cada vez mais velhos. Os novos gostam mais de brincar com o computador e beber umas cervejas. No meu tempo não se bebia tanto. Quando eu dava aulas no liceu, em Abrantes, havia um jornal que era o “Toque de saída” e eu fazia sempre as palavras cruzadas para lá, mas nunca vi seguidores”.

Sendo um jogo de palavras, talvez os professores de Português pudessem dar uma ajuda. “Estou convencido que os professores já não têm muita disponibilidade para isso. Os charadistas são vistos como um grupo de ‘maluquinhos’ que se entretêm com umas coisas… Mas é muito engraçado, aprende-se muito com o charadismo. Nos concursos que aí andam eu respondo a 90 por cento das perguntas, a não ser aquelas sobre livros, músicas ou filmes de que nunca ninguém nunca ouviu falar. Lá em casa costumo dizer ‘sei tanto que nem sei o que sei’. Destas coisas. Não tenha dúvidas, que possuo um conhecimento de sinonímia extremamente avançado. Os bons charadistas têm uma sinonímia enorme, que ninguém tenha a mínima dúvida”.

Alcínio Serras não sabe ao certo quantos charadistas existem no país. “Talvez uns cento e tal em todo o país. Mas também há muitos que não são sócios, embora as quotas custem cerca de 20 euros por ano com direito à revista.”, adianta para acrescenta: “A “Tertúlia Edípica” nasceu em 1922, salvo erro em 21 de Janeiro, e há um charadista de Rio de Moinhos, que nasceu no dia em que foi fundada a “Tertúlia Edipica”. Outra coisa que as pessoas deviam saber é que o charadismo prolonga a vida das pessoas porque lhes exercita as capacidades mentais. Está provado cientificamente que sim. Um dos homens mais velhos da Europa, talvez do mundo, é um charadista que vivia no Porto, mas que é da zona de Braga, o Ar. Regedor, era o pseudónimo, tem 111 anos. Já não faz charadas, mas está vivo”.

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