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01 SET 2008
JOSÉ AMARO: ESCULPIR EM MADEIRA
Por SÓNIA PACHECO

 

Carros, carroças, alfaias agrícolas, moinhos, barcos ou até representações de alguns locais de Rio de Moinhos. São peças em madeira esculpidas por José Amaro. Algumas são apenas réplicas, outras são criações suas, mas há as que guardam consigo uma história. 

 

A madeira de laranjeira, limoeiro, pinheira ou pinho já foi cortada em tábuas. Agora, o formão, os berbequins, as serras, as limas ou as lixas são manuseadas entusiasticamente. José Amaro nem dá pelas horas passarem. Ao longo dos dias, as tábuas vão ganhando forma e a simples madeira acaba por se transformar em carros, carroças, alfaias agrícolas, moinhos, barcos ou até réplicas de alguns locais. Ao lado da oficina, cerca de 30 periquitos, seis caturras, dois canários, um pintassilgo e um rosicola são a sua única companhia.

“Já cá tinha o bichinho quando era pequeno”, declara José Amaro que em criança fazia os seus próprios brinquedos e agora, depois de reformado, “em vez de andar por aí encostado”, dedicou-se a esta arte. É bastante trabalhoso e a paciência, especialmente para executar os mais pequenos pormenores, é essencial. No entanto, “é um bom remédio para o stress”. Enquanto está debruçado sobre a bancada da sua oficina até esquece a vida que corre lá fora.

Em casa tem expostas as cerca de meia centena de peças em madeira que esculpiu durante os últimos cinco anos. A Igreja de Rio de Moinhos, freguesia onde reside, foi uma das primeiras peças que fez depois de se reformar da PSP. A Fonte da Chã ou a Fonte das Duas Bicas são outras das réplicas da sua aldeia. A primeira tem a particularidade de nela se poder ver a bica original. “Também é preciso ter conhecimentos acerca do que se está a retratar”, acrescenta José Amaro, 57 anos.

Algumas peças são apenas réplicas, mas há outras que guardam consigo uma história. É o caso do “Gaio”, um dos barcos que outrora navegou no rio Tejo. José Amaro até ajudou a pintar o original. “Era do meu grande amigo Zé Maria. Uma semana depois de ele morrer queimaram o barco, mas eu fiquei com uma réplica feita por mim”.

Também as alfaias agrícolas que esculpiu lhe relembram a sua juventude. Viveu numa quinta, na Chainça, também no concelho de Abrantes, onde os tios tinham duas noras e um burro. José Amaro conta que ficava a tomar conta do burro enquanto trabalhava numa das noras e depois tinha de o mudar para a outra para tirar mais água. Mas, como era novo, o que queria era jogar à bola. Um dia, “pus uma cenoura à frente do burro. Dei-lhe umas vergastadas e o burro lá ia atrás da cenoura. Eu fui jogar à bola. Mas o burro esqueceu-se do que estava a fazer e partiu aquilo tudo. Levei uma sova do meu tio”. Enquanto solta uma gargalhada mostra que na sua réplica os alcatruzes rodam e também a original era de madeira, à excepção dos alcatruzes que eram de chapa. Mas José Amaro pretende que na sua peça os alcatruzes sejam de barro. “Eu ainda tentei, mas rebentei com o microondas. Quando tirei o prato com o barro e o pus em cima da bancada desfez-se em mil bocados. Mas ainda não perdi a esperança de fazer os alcatruzes em barro”.

Aos sete anos foi viver para a Quinta D. Maria Amélia, em Vale de Roubam, Abrantes. Era aí que existia a picota que esculpiu. “Essas também sei como eram feitas porque era eu que as arranjava”, declara José Amaro que também construiu réplicas de uma grade, de uma charrua e do arado que era manuseado pelo seu tio. “Eu andava sempre atrás dele”.

Mas há ainda outras peças que nem são réplicas, nem guardam histórias. São criações suas, baseadas no que conhece ou no que vai vendo. “Quando vejo uma coisa bonita até chego a tirar fotografias com o telemóvel, chego a casa e faço”. Numa das visitas de ranchos folclóricos à aldeia, José Amaro viu que um desses grupos actuou com instrumentos feitos por si e quis também fazer um. Num outro rancho vinha uma criança que trazia um carrinho de mão e também construiu um.

Já a caravela baseia-se naquilo que conhece. “É tudo inteiriço, o casco foi escavado na madeira e até tem canhões”, explica José Amaro, afirmando que a criatividade também se alia a esta arte. O carro de mão é uma garrafeira e a peça que era para ser um barril, para pôr em cima da carroça, rachou e foi transformado num baú. Também o burro de madeira que andava pela oficina, de canto em canto, é agora um baloiço. Já o reco-reco surgiu no dia em que queria ir cantar os reis e não tinha nenhum instrumento.

As peças vão surgindo, mas José Amaro não sabe determinar com exactidão o tempo que demora na feitura de cada uma já que, por vezes, começa a trabalhar numa outra peça sem ter terminado a que ainda estava a esculpir. Outras vezes chega mesmo a modificar algumas depois de concluídas. Por outro lado, “há dias que não toco nisto, mas depois há outros que não consigo sair da oficina e a minha mulher até tem de lá me ir chamar”. A esposa “também opina. Uma vez disse-me que queria um mealheiro em forma de banco e eu fiz um banco com uma gaveta”. Para além de opinar, às vezes, também ajuda. “Foi ela que me deu o tecido e as linhas e ajudou a fazer a vela do moinho”.

José Amaro diz que agora pretende construir um chaveiro e uma cesta em ferro, com fio sisal, para pôr revistas. Também já lhe pediram para fazer a Rua do Canto, onde mora.

Para além das peças que tem em casa e que já expôs em Rio de Moinhos, faz também peças em frutas, como os barcos em melão, para enfeitar as mesas dos casamentos. Confessa que qualquer dia faz também uma peça em pedra, mas nunca será capaz de vender nenhum dos seus trabalhos.

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