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01 DEZ 2006
OS RANCHOS DA AZEITONA
Por SÓNIA PACHECO

 

Noutros tempos, ranchos de mulheres e homens varejavam o olival e apanhavam os bagos dos panos de linhagem, desde o raiar do dia até depois do sol posto. Hoje, como na Quinta do Pouchão, a apanha é mecanizada

 

A madrugada vai alta. Mulheres e homens já caminham em direcção ao olival e, entre o bater das passadas ouvem-se velhas histórias e cantigas. O tempo passa e enquanto os primeiros raios de sol espreitam, estendem-se os panos debaixo da oliveira, agarram-se as varas e forma-se uma roda em torno da árvore. As varas batem com precisão e a oliveira varejada deixa cair a azeitona. As mulheres enchem os cestos e os homens acartam-nos. O ritual repete-se até ao pôr-do-sol.

“Quando chovia ficávamos a pingar”, conta Lurdes Rodrigues. “Não havia os fatos como há agora”. Mas, apesar do
duro trabalho, os dias corriam alegremente. Cantava-se ao desafio e as velhas histórias teimavam em não desaparecer. Quando a noite chegava o rancho dirigia-se para o celeiro que os patrões tinham nos montes. Como vinham de longe era ali que pernoitavam durante as semanas que durava a apanha da azeitona. Traziam de casa tudo o que precisavam. As tarefas eram feitas à luz dos candeeiros a petróleo e no chão acendia-se o lume para cozinhar o jantar. Às vezes ainda havia tempo para umas breves danças e chegada a hora de dormir estendiam-se as mantas de trapos em cima da palha.

“Os casais dormiam numa fila e os solteiros noutra, mas, às vezes, havia enganos”, exclama Lurdes Rodrigues com ar brejeiro. Natural de Vale do Arco, concelho de Ponte de Sôr, nem sempre se ficava nos montes durante a apanha. Nesses anos, chegava a fazer hora e meia de caminho entre a sua casa e o olival. “Íamos a pé, mas, mesmo cansados divertíamo-nos”, diz, recordando os bailes que, ao domingo, juntavam todos os que participavam
na apanha da azeitona.

Nestes tempos, “arranjavam-se grandes namoros e eu tive a minha parte”, conta Custódio Alves muito sorridente. Tem 46 anos e há cerca de 30 anos que engrossa os ranchos da azeitona. É natural de Ponte de Sôr e tem andado sempre pelo Alentejo. É a primeira vez que vem para a zona de Abrantes. Agora os tempos são outros, mas, tal como Lurdes Rodrigues, diz que, antigamente, embora o trabalho fosse mais duro era “muito mais divertido”.

Lurdes Rodrigues começou na apanha da azeitona aos 8 anos. Ganhava 25 tostões por dia. Hoje, aos 66 anos, afirma ser uma mulher de força. “Não fico atrás das mais novas, não tenho medo de trabalhar ao lado delas”. Carla Nunes, 28 anos, estreante nestas lides, acena afirmativamente dizendo que “a Lurdes canta muito”.

Os tempos mudaram e, actualmente, as máquinas dão uma ajuda neste trabalho duro que vinha com o Inverno. Na Quinta do Pouchão, em Alferrarede, a apanha da azeitona é mecanizada. Uma das máquinas, com chapéu invertido, quase não necessita de mão-de-obra, mas a outra é vibratória abana a árvore e é preciso recorrer à mão-de-obra, aos tradicionais panos e às velhas varas.

Na Quinta do Pouchão, o olival estende-se por 256 hectares, 100 de cultura intensiva das variedades cobrançosa e picual e 156 de cultura tradicional da variedade galega. Ao todo são 37 mil oliveiras que, este ano, fornecerão cerca de 700 toneladas de azeitona para o Lagar do Cabeço das Nogueiras, na Pucariça. Nesta mesma quinta, onde também se produz o vinho “Terras do Pouchão”, existem ainda 50 hectares de vinha.

“O bom azeite começa a fazer-se no campo. Há práticas agrícolas que têm de ser feitas e todos os pormenores contam no final”, diz Alberto Serralha que com Ilídio Francisco detém a empresa Sociedade Agrícola Ouro Vegetal, Lda (SAOV) que explora a Quinta do Pouchão e o Lagar do Cabeço das Nogueiras.

“A empresa não tem tempos mortos”, declara Ilídio Francisco que explica que se for necessário tratar o olival trabalha-se 24 horas por dia até terminar o tratamento. No entanto, só se avança quando se justifica. “Temos a armadilha e semanalmente vamos ver se a praga está instalada e se é superior a 10%”. Por outro lado, a colheita dos frutos na maturação ideal com poucas horas entre a apanha e a laboração são, segundo Ilídio Francisco, contributos que justificam os padrões de alta qualidade.

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