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01 ABR 2007
RENOVAR A TRADIÇÃO
Por MARGARIDA TRINCÃO

 

Já não são os marítimos que sobem e descem o Tejo até Constância para pedir a bênção a Nossa Senhora da Boa Viagem, mas na segunda-feira de Páscoa o cais da vila poema vai encher-se de embarcações.

 

Os primeiros registos da festa da Senhora da Boa Viagem de Constância remontam ao século XVIII, mais exactamente a 1788. Pelo Tejo navegavam barcos de grande porte fazendo a ligação entre Lisboa e as zonas mais interiores do país.
A tradição manteve-se ao longo dos séculos. Os homens desciam e subiam o grande rio a bordo dos varinos, barcos que chegavam a atingir 20 e 30 toneladas. Vida dura que só conhecia descanso por altura da Páscoa.
“Vinham na quarta-feira da Semana Santa, assistiam às cerimónias religiosas e voltavam a partir na quarta-feira da semana seguinte. Era o único período de descanso que conheciam”, afirma António Matias Coelho, historiador e assessor da câmara de Constância.
Matias Coelho começou a colaborar com o município de Constância, quando o actual presidente, António Mendes, foi eleito. Nos finais da década de 80 a actividade marítima já tinha acabado, a festa só se mantinha graças à paróquia.
“A primeira festa a que assisti foi em 1990 e tive a nítida sensação que ela iria desaparecer se nada se fizesse. Nesse ano, apenas três barcos chegaram a Constância”, recorda o historiador.
No ano seguinte, a autarquia chamou a si a organização da festa e, sem marítimos no activo, os festejos adquiriram os actuais moldes. O último dos marítimos de Constância, Hermínio Bento, faleceu recentemente.
A Festa de Nossa Senhora da Boa Viagem “sempre foi feita pelos marítimos, pelos homens dos barcos de transporte”, sublinha Matias Coelho, desfazendo a confusão que por vezes se estabelece com barqueiros e pescadores.
“A pesca nunca foi uma actividade económica muito relevante em Constância. Claro que havia pescadores, mas poucos, e também barqueiros que faziam a travessia entre as margens, mas a festa era dos marítimos, profissão que gozava de certo poder económico e social na vila”, continua.
Embora o seu trabalho fosse no rio - de Abrantes aos portos da grande Lisboa – apelidavam-se de marítimos. “Ao Atlântico nunca chegavam, andavam no mar da Palha e a designação vem daí”. A este propósito Matias Coelho conta a história de um decreto régio que dispensava os marítimos de cumprirem o serviço militar. Os marítimos de Constância quiseram saber se a legislação se lhes aplicava, mas a resposta foi negativa: marítimos são os que trabalham no mar ou nas praias do mar. Apesar disso continuaram a considerar-se “marítimos”.
A actividade de transporte no Tejo conheceu a primeira grande quebra com a criação do caminho de ferro, mas foi a abertura das rodovias que lhes pôs termo. Mesmo assim, a Festa da Senhora da Boa Viagem foi organizada e custeada pelos marítimos até à década de 60 do século passado. Até que não foi possível entregar a bandeira azul a ninguém. Era este o símbolo que identificava o festeiro, o homem responsável pela festa no ano seguinte. 
“A festa tinha acabado nessa altura, se a paróquia não continuasse a manter a procissão e a bênção dos barcos”, sublinha Marias Coelho. E porque entende que “a tradição é um filme a que cada geração deve acrescentar alguma coisa”, os concelhos ribeirinhos são convidados a participar nestes festejos com os seus barcos engalanados

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