Os tapetes de flores no chão das capelas e os archotes na noite de Quinta-feira Santa são o cartão de visita da Semana Santa, em Sardoal.
Fé, tradição e misticismo marcam a Semana Santa, em Sardoal. As capelas enfeitadas e a Procissão dos Fogaréus merecem um lugar de destaque. Quinta-feira Santa é um dia especial.
Na véspera, as gentes de Sardoal juntam-se para dar continuação a uma tradição, talvez única no país, que remonta ao século XIX. Durante o dia, colhem-se as flores e, à noite, são desfolhadas, enchendo-se vários alguidares com pétalas de todas as cores e feitios. Ao mesmo tempo, desenha-se o chão das seis capelas (S. Sebastião, Senhor dos Remédios, Sant’Ana, Santa Catarina, Nossa Senhora do Carmo e Espírito Santo) e da Igreja da Misericórdia. Pela noite fora, enquanto as conversas se desenrolam, o desenho esboçado no chão vai ganhando forma, fazendo-se notar pelas cores das pétalas e das verduras naturais. Na manhã seguinte, as portas serão abertas e a beleza destas imagens alusivas ao tempo Pascal pode ser apreciada até ao Domingo de Páscoa. O ritual repete-se todos os anos e a tradição vai passando de geração em geração.
A Capela de Santa Catarina está a cargo do GETAS – Centro Cultural de Sardoal. Manuela Grácio, presidente do grupo, refere que as pessoas das aldeias ajudam e, na quarta-feira Santa, também colhem todas as flores que podem para depois alguns membros do GETAS as transportarem para a capela. Orgulhosamente, diz que o grupo “tem sido inovador” uma vez que ao tapete de flores idealizado pelo grupo se juntam artefactos ou tecidos. No entanto, faz questão de frisar que, apesar de inovadores, nunca deixam o tradicional. “É importante para a vila manter as tradições da Semana Santa”.
Também os mais novos mantêm esta tradição viva. É exemplo a Escola EB 2,3/S Dra. Maria Judite Serrão Andrade que, pelo sexto ano consecutivo, têm a seu cargo o arranjo da Capela do Senhor dos Remédios, através de motivos figurativos elaborados pelos estudantes.
Mas não é só a abertura das capelas que tornam a quinta-feira santa especial. A Procissão dos Fogaréus é também um momento único. À noite, a electricidade da rede pública é desligada e, da Igreja da Misericórdia, sai a também chamada Procissão do Senhor da Misericórdia.
Apenas velas, archotes ou candeias iluminam os fiéis pelas escuras ruas de Sardoal. Nas janelas e varandas das casas, assim como, nas escadarias do Convento de Santa Maria da Caridade, as lamparinas de azeite e cera, ou as lanternas de vidro marcam o trajecto. O silêncio é somente abalado pelas lentas passadas dos fiéis que, aliadas às marchas fúnebres da centenária Filarmónica União Sardoalense, carregam o ambiente de misticismo. A cargo da Irmandade da Santa Casa da Misericórdia, cujos Irmãos, envergam opas pretas, a procissão dos fogaréus atinge o seu ponto alto com o Sermão do Mandato proferido na Igreja de Santa Maria da Caridade. Da procissão destaca-se ainda a presença das réplicas dos painéis representativos das “Cenas de Paixão”. Os painéis autênticos, provavelmente do século XVIII, podem ser vistos na Igreja da Misericórdia.