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06 JUL 2016
Navegação astronómica na época dos Descobrimentos
Por Jornal Abarca

Todos os anos se repetem evocações da partida da armada, comandada por Vasco da Gama, com destino à Índia, feito que marcaria a história de Portugal e mesmo a de boa parte dos países da Europa Ocidental.

Largando do Tejo a 8 de julho de 1498, as naus navegariam com base em conhecimentos práticos adquiridos em muitas outras navegações exploratórias anteriormente realizadas ao longo da costa ocidental da África, com a particularidade de, na parte inicial (até à “possessão” da Mina), seguir o já experimentado Bartolomeu Dias que, cerca de dez anos antes, tinha cumprido trajeto idêntico, um pouco para além do Cabo da Boa Esperança.

A navegação pelas estrelas já não era novidade, sendo relativamente fácil determinar a latitude da posição dos navios medindo a altura do pólo celeste, marcado, aproximadamente, pela Estrela Polar. É certo que a determinação da “altura do polo” não oferecia dificuldades, quando as medições eram feitas em terra mas, o mesmo não acontecia em alto mar, onde a ondulação fazia baloiçar os navios e os astrolábios, tornando as medições difíceis e pouco rigorosas.

Na verdade, o movimento de precessão da Terra faz alterar (embora muito lentamente) a posição do pólo, pelo que, naquela época, a Estrela Polar se encontrava afastada do pólo cerca de 3,5 graus. Por isso, constituiria erro grosseiro tomar a altura da polar como a latitude do lugar, dado que ela descrevia um círculo em torno do pólo, podendo apresentar-se deslocada para cima, para baixo, para a esquerda ou para a direita daquela importante posição. Tal facto tinha suscitado o estabelecimento do “Regimento da Polar”, um conjunto de regras para, em função da época do ano e das horas da noite, descontar o referido desvio e conhecer rigorosamente a posição do pólo e, com a precisão que o balanço dos navios permitia, apontar-lhe o astrolábio para medir a sua altura e, consequentemente, obter a latitude.

Como durante o dia não era possível utilizar as estrelas para determinar a posição, o único recurso era o Sol, cuja altura – ao meio dia – constituía o elemento essencial de um conjunto de cálculos que obrigavam ao uso de “Tábuas de Declinação do Sol”. Com efeito, devido à inclinação da Terra, a altura do Sol vai variando ao longo do ano, projectando-se sobre as cabeças de observadores situados entre o Equador e o Trópico de Câncer, no período que vai de março a setembro e, sobre os lugares entre o Equador e o Trópico de Capricórnio durante os meses de setembro a março. Deste modo, um habitante de qualquer ponto situado entre os “trópicos” verá o Sol por cima da cabeça (altura de 90 graus) em duas datas diferentes, facto que Camões cita, ao referir, ao Rei de Melinde, “…aquelas regiões/ Por onde duas vezes passa Apolo” (Canto V).

Naturalmente, mesmo que alguns pilotos não conhecessem em detalhe todos os cálculos para elaboração de tabelas e regras, eles haviam sido efetuados com base no conhecimento de que a altura do equador celeste – linha em relação à qual é medida a declinação – é sempre o complemento da latitude, ou seja, noventa graus menos a latitude.

Por exemplo, uma determinação nas proximidades das ilhas Canárias, a 15 de julho (o sábado seguinte à largada de Lisboa) levaria a medir a altura do Sol ao meio dia solar (quando ele atinge a altura máxima) e, depois, a consultar a “Tábua” do mês. O resultado seria uma altura de 83,5 graus (se fosse possível efetuar uma medição rigorosa) e o valor da declinação lido na tabela, 21,5 graus. Subtraindo este valor à altura do Sol, ter-se-ia a altura do equador celeste, ou seja, 62 graus. Desse modo se obteria a latitude de 28 graus (90-62) que é, com efeito, a latitude das Canárias.

Não se conhecem registos de determinações feitas na ilha de Santiago, onde a Armada chegou a 27 de julho (e permaneceu uma semana) mas, decerto os procedimentos terão sido repetidos a fim de garantir o sucesso do propósito de, navegando pelas estrelas, chegar à Índia.

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