Carlos do Carmo cantava que os putos pareciam “bandos de pardais à solta” com uma bola de pano, na ladeira a correr, com uma fisga na mão, com o berlinde na escola ou o pião na algibeira. Claro que a letra de José Carlos Ary dos Santos é muito mais profunda (embora já seja pós-25 de abril), do que o objectivo destas linhas.

No entanto, tem sido recorrente dar comigo a pensar nos versos desta canção nos quilómetros que faço pela nossa região. São ruas, largos, praças completamente abandonadas, sem crianças a brincar. Cada vez mais as crianças são afundadas em tablets, wi-fi’s e estrangeirismos de última geração pelos próprios pais, esses mesmos que cresceram nas ruas que agora estão desertas. É um contra-senso que me recuso a aceitar.

É o mais fácil, eu entendo. Porque a criança assim não chateia e está ocupada. Eu entendo que os dias actualmente corram depressa demais para pais que trabalham horas sem fim para poderem comprar todos esses equipamentos para entreterem os filhos e assim perdem tempo a ensinar-lhes a ser crianças. Irónico.

Há também a questão da segurança. Não sou assim tão velho, mas “no meu tempo” era relativamente seguro andar na rua, em grupo, até anoitecer. Hoje em dia, admito, isso será mais arriscado.

Mas, no meio disto tudo, uma palavra às autarquias: o que têm feito para inverter isto? Não há nada que tire as crianças de casa? Fazem-se umas férias desportivas, muitas vezes pagas a peso de ouro, durante uma ou duas semanas e mais nada. Não há projectos de envolvimento entre a comunidade e as crianças, não há nada que leve os jovens a vir para a rua, a interagirem entre si e com associações locais, não há torneios desportivos, não há concursos que ponham à prova as habilidades e talentos dos mais novos. Assistimos, também aqui, a um triste inverter dos valores e hábitos.

O que menos me apetecia dizer era que no meu tempo as coisas eram melhores. Mas, de facto, eram. Deixo este alerta e solto uma questão num misto de tristeza e revolta: onde andam os putos deste povo?