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20 SET 2022
OPINIÃO | "A trova do vento que passa", por Estêvão de Moura
Por Jornal Abarca

Por estes dias, quando ainda é Verão (a estação do ano que os anglo-saxónicos sabiamente rotularam de “boba” – por que muitas coisas não são, neste tempo, levadas a sério!...) entra-me por adentro destes dias lânguidos a voz, sem paralelo, do Adriano Correia de Oliveira (ACO) e um diálogo na TSF em que a ex-companheira e filha discorriam (com queixas,… muitas queixas,…) sobre o Homem, o marido, o pai - no seu tempo e fora dele. E deu-me para ir à procura de uma canção que mostrasse, em toda a sua plenitude, a força e a ideia de um tempo que o ACO representara para toda uma geração de portugueses.

A minha escolha recaiu sobre a “Trova do Vento que Passa”: uma canção interpretada pelo ACO com música de Luís Portugal e as palavras de Manuel Alegre. A “Trova” é uma canção intemporal; com uma interpretação sublime em que a voz às vezes arrastada, outras parecendo trovejar, transformou o texto e a música num hino - ao mesmo tempo poderoso e emotivo - que durante muito tempo foi a bandeira mais alta elevada contra a opressão e a ignomínia do regime político retrógrado que amordaçava os portugueses e traia a soberania do Povo através de uma violência desmedida; de uma infame vigilância policial e da perseguição de todos quantos ousavam afirmar um direito a poder pensar e agir com cidadania.

É claro que me emocionei a ouvir a “Trova do Vento que Passa”! E não só por que é Verão! Aquelas palavras, sublimemente entoadas, remetem não só para um tempo (felizmente! Acabado,…) mas também para um modo de ser e de estar que põe no centro do tempo histórico a Pessoa que é capaz de pensar e dizer Não!...

Por mais incrível que tal possa parecer. Para alguns até uma heresia,… a “Trova do Vento que Passa” é uma canção que podia ter sido feita para os nossos dias (ou, pelo menos, para alguns dias) tal é a actualidade da sua mensagem – neste tempo em que as situações de autoritarismo, perda de cidadania e multiplicação da ignorância funcional tendem a transformar-se em algo comum, sem que a Democracia tenha criado os mecanismos para o impedir; ou travar a sua progressão,…

Num tempo em que parece voltar a existir algum receio em promover os valores da liberdade e da livre opinião como pilares básicos da Democracia; e muitos portugueses parece terem receio de dizer não! Nas mais diversas situações, com receio de hipotéticas (ou reais e iníquas) represálias seria útil colocar uma canção como esta nos planos de estudos dos mais jovens. Eventualmente, até, começar o dia escolar a ouvir esta canção em fundo, para que, por um lado, não fosse esquecida essa “tão longa e escura noite” que massacrou os portugueses durante mais de quatro décadas e deixou Portugal como um dos países mais atrasados da Europa e do Mundo Ocidental e, por outro, existisse a possibilidade real de formar pessoas conhecedoras dos seus direitos de cidadania e com a capacidade para criar um ambiente social em que dizer não é algo tão natural que nem merece ser recordado.

O que, por agora, não é ainda o caso! Nem parece que venha a ser nos próximos tempos,…

O Verão! É isto que tem de bom,… Permite-nos sonhar acordados!... E pensar o impensável noutro tempo. Vou ouvir a “Trova” e relembrar esses tempos em que a palavra liberdade fazia sentido quando se dizia não!

E sim, os familiares de ACO têm razão quando dizem que ele não merecia o esquecimento a que o votaram. Mas, enfim, a maldade toca a todos; até aos que não gostam que alguém lhes diga que não!

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