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01 MAR 2017
A alma portuguesa ou a voz do povo
Por Jornal Abarca

A par das expressões idiomáticas, os provérbios ou ditados populares transmitem a sabedoria do povo, acumulada pelas sucessivas gerações, num determinado meio cultural, espelhando o saber “de experiência feito” e continuam a ter aplicabilidade.

Há os de todos os géneros e para todas as circunstâncias, a sua multiplicidade e a sua variedade são latas. Outra particularidade que possuem é que funcionam como sentenças de oráculo. Infalíveis, porque, muitas vezes, opostos, servem as várias hipóteses possíveis, logo acertam sempre e satisfazem amplamente as várias perspetivas e possibilidades. Ora vejamos: “A mulher e a pescada querem-se da mais grada”, mas também “A mulher e a sardinha querem-se da mais pequenina”; “Chuva de São João, talha sem vinho e não dá pão”, pelo contrário “Chuva de São João, cada pinga vale um tostão”; “Duro com duro não faz bom muro”, mas “Amor com amor se paga” ou “Olho por olho, dente por dente”; “O que se não faz no dia da romaria, faz-se no outro dia”, contrariamente temos “Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje”; “Voz do povo é a voz de Deus” opondo-se a “Voz do povo é a voz do Diabo”, entre outros – decida quem puder onde se encontra a verdade. Quanto aos últimos, antes inclinava-me para a primeira versão, agora talvez para a segunda…

Outros há que reiteram ou seguem a mesma linha de orientação: “Antes que cases, vê/olha o que fazes” ou “Antes que o mal cresça, corta-se-lhe a cabeça”; “Dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” ou “Dar o seu a seu dono”; “Mais vale um pássaro na mão do que dois a voar” ou “Mais vale um ‘toma’ do que dois ‘te darei’”; “Para grandes males, grandes remédios” ou próximo “Para ladrão, ladrão e meio”; ainda “Cão de caça vem de raça” ou “Quem sai aos seus não degenera” ou “Filho de peixe sabe nadar” ou ainda “Pelo fruto se conhece a árvore” e, na mesma linha e com equídeos, temos “Burro velho não aprende línguas” ou “Cavalo velho não pega andadura”. Talvez por isso a Humanidade permaneça e repise os mesmos erros…

Por outro lado, há os baseados na observação empírica com lições retiradas: “Baleias no canal, terás temporal (São Jorge)” ou “Gaivotas em terra sinal de tempestade”; “Janeiro, fora uma hora” ou “Junho abafadiço, sai a abelha do cortiço”, “Junho calmoso, ano formoso”, “Junho floreiro, paraíso verdadeiro”… Aqui, como as diretivas são de índole mais prosaica e de aplicação mais imediata e linear, é possível que se sigam ideias…

Há os equivalentes pelos vários países de língua portuguesa, por exemplo, “Cão que levou mordida de cobra tem medo de salsicha (Brasil)” equivalente ao “Gato escaldado de água fria tem medo”; tal como “Pimenta nos olhos dos outros é refresco (Brasil)” ou “Com o mal dos outros passo/posso eu bem”. Depois destes últimos, que tão bem ilustram o ser humano, recordo outro “Lobo não come lobo” que atenua os anteriores e significa que existe alguma solidariedade entre pares, pelo menos. Contudo, associo-o, de imediato, também, à máxima "Homo homini lupus” (o Homem é o lobo do Homem) de Plauto, celebrizada, por Thomas Hobbes (filósofo inglês do século XVII) que faz (re)pensar. Para terminar esta sequência de forma otimista, deixo o pensamento, tão aplicável à atualidade, do ator Nuno Lopes “Só existem demónios enquanto não os humanizamos” (a propósito da peça A Noite da Iguana, de Lawrence Shannon, no São Luís).

Presentes nas várias línguas, não se consegue resistir ao provérbio chinês com a sua ironia “Quando o sábio aponta para a lua, o idiota olha para o dedo” ou a muitos outros com as suas lições de vida “Fica sempre um pouco de perfume nas mãos de quem oferece flores”, “Todas as flores do futuro estão contidas nas sementes de hoje”, “Cem homens podem formar um acampamento, mas é preciso uma mulher para fazer um lar”…

Os provérbios são espelhos da mentalidade e sabedoria das gentes e, para utilizar uma expressão também do povo, têm “pano para mangas”, ou seja, muito a explorar. Não obstante, este texto já vai longo, deixemo-nos, por hora, não de quixotices, mas de visões à Sancho Pança, e concluamos, pois não pretendemos enfastiar algumas pessoas…

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