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20 DEZ 2017
NATAL 2017
Por Jornal Abarca

Nunca soube porque comemorávamos o Natal. Mas desde sempre me lembro de uma confusão de celebrações que incluíam sapato na chaminé, onde um menino desconhecido depositaria brinquedos ou chocolates e um pinheiro que enfeitavam com bolas de vidro colorido e fios brilhantes, e uns suportes para as velas, em lata e com uma engenhosa mola com que se prendiam nos ramos da árvore. Acendiam as velas sempre com receio daquela coisa se incendiar…

Mais tarde o menino passou a velho e barbudo e viajava de trenó puxado por renas.

Nunca vi o menino ou o barbudo… Nunca ouvi os guizos do trenó. Nunca percebi muito bem o que se comemorava e porque as mulheres da família dedicavam horas infindas a cozinhar doces e tínhamos de comer bacalhau às onze da noite.

Muito depois de ter surpreendido o tio Constantino atrapalhado com uma caixa que ocultava um boneco e não dava jeito nenhum para pendurar no pinheiro, dificuldade que os adultos resolveram deixando o boneco no meu sapato, muito depois é que a tia Pepa obteve autorização par armar um presépio. Aí, comecei a perceber que se tratava do aniversário daquele bebé esbracejando numa manjedoura, guardado à vista por dois adultos em trajes esquisitos, uma vaca barrosã e um burro idiota, acompanhados por três ou quatro pastores ajoelhados e umas ovelhas lãzudas que pastavam em silêncio o musgo que o Carlota apanhara. Por cima da cabana uma estrela de cartão e lantejoulas, o espírito santo disse a tia, parecia querer iluminar aquela pobreza.

Nessa época não encontrei grandes presentes no sapato. Um boneco, uns bombons dentro de pratas faiscantes…

O mistério mantém-se… Talvez eu comemore o nascimento do Sol como acreditavam os Romanos, que também não se entenderam muito bem com o que celebravam.

Mas a alegria dessas noites ficou para sempre dentro de mim.

Ou eu que fiquei no moinho.

Para sempre.

 “Último Poema”

É Natal, nunca estive tão só.

Nem sequer neva como nos versos

do Pessoa ou nos bosques

da Nova Inglaterra.

Deixo os olhos correr

entre o fulgor dos cravos

e os dióspiros ardendo na sombra.

Quem assim tem o verão

dentro de casa

não devia queixar-se de estar só,

não devia.

Eugénio de Andrade(1923 – 2005)

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