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26 ABR 2012
SAÚDE
Serviço Nacional de Saúde
Uma conquista de Abril... em risco
Por SÓNIA PACHECO

 

Onze concelhos. Três unidades hospitalares, um hospital da misericórdia, nove unidades de cuidados continuados e cinquenta centros e extensões de saúde com médico. Mas, desde 2005, a Medicina Geral e Familiar desapareceu em 22 extensões de saúde e as taxas moderadoras, apenas de um ano para o outro, simplesmente duplicaram

 

É uma das grandes conquistas de Abril. É um direito consagrado na Constituição da República Portuguesa. É, pela Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro, “garantido a todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica e social”. Mas, volvidos 32 anos, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) começa a não ser acessível a todos.
E saber onde há clínicos de Medicina Geral e Familiar também não é uma informação de fácil acesso. O jornal Abarca contactou, através de e-mail, juntas de freguesia e câmaras municipais para além dos centros de saúde, Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) e Administrações Regionais de Saúde (ARS) da sua área de influência. Algumas autarquias, locais e municipais, acederam, de facto, ao solicitado. Mas, a maioria ou não respondeu ou simplesmente afirmou que não dispunha de dados. As autarquias não são responsáveis pelas estatísticas em matéria de saúde, existem entidades com essa responsabilidade, mas são certamente responsáveis pela população que governam e devem com certeza ser conhecedoras dos problemas que afectam as suas áreas de jurisdição. Um habitante de uma longínqua freguesia sem extensão de saúde não irá questionar a ARS em Lisboa, Évora ou Coimbra para saber onde poderá ter acesso a um médico. Dirige-se certamente aos eleitos a quem o povo democraticamente confiou a sua governação. Liberdades que Abril conquistou! Enfim... Pelo menos, a resposta poderia ter sido outra.
Mas, voltando ao SNS que de “tendencialmente gratuito”, segundo a Constituição Portuguesa, parece que passou a tendencialmente pago, aceder a um médico é quase uma aventura. Muitas extensões de saúde estão poucas vezes abertas e o atendimento médico, onde existe, é, em muitas situações, demasiado limitado.
Segundo os critérios da Entidades Reguladora da Saúde, a área de influência do jornal Abarca precisa de 82 médicos de família, 1465 horas de atendimento por semana e 72 centros ou extensões de saúde. Uma hipótese para aliar a racionalização dos recursos à proximidade dos cuidados de saúde. Mas seguir os critérios à risca no papel não é viável no terreno. A solução passará por agrupar ainda mais extensões de saúde que disponham dos médicos necessários para a população que abrangem e alargar o horário de atendimento pode realmente resolver o problema da falta de médicos de família. Fora do horário de atendimento, restam as urgências dos hospitais ou um Serviço de Atendimento Permanente.
Mas, desde que se saiba onde ir, as dificuldades surgem quando a introdução de portagens obriga os utentes a optarem por um trajecto temporalmente mais distante, quando os combustíveis não param de subir e até uma curta viagem se torna dispendiosa, quando não se tem veículo próprio e os transportes públicos aumentam demasiado ou simplesmente não existem em tempo útil, quando a solução é chamar um táxi e só as viagens são quase insuportáveis.
As viagens e as taxas moderadoras! De um ano para o outro simplesmente duplicaram. E coincidência ou não, o Centro Hospitalar Médio Tejo registou em Janeiro um acentuado decréscimo nas idas às urgências, nas sessões em Hospital de Dia, no número de consultas externas e até nas intervenções cirúrgicas.
E se um habitante de Vale de Horta, freguesia de Vale das Mós, com um rendimento mensal de 630€ e sem transporte próprio, precisar de ir às urgências do Hospital de Abrantes depois das 21 horas? Solução: Chamar um táxi que a esta hora já cobra uma taxa nocturna. O simulador online da ANTRAL aponta para nada menos de 25 euros por cada viagem, ou seja, 50 euros. A taxa moderadora de uma ida a estas urgências é de 17,50€, mas acrescem as taxas dos Meios Complementares de Diagnóstico e Terapêutica que podem chegar aos 50€. Contas feitas, um habitante de Vale de Horta poderá pagar mais de 100 euros numa ida às urgências do Hospital de Abrantes. E ainda falta a conta da farmácia.

 

Taxas pouco Moderadas

Apenas de um ano para o outro, as taxas moderadoras duplicaram, ao contrário do que tinha acontecido nos últimos cinco anos. De 2007 para 2011 o maior aumento registou 85 cêntimos no atendimento em urgências. Mas de 2011 para 2012 os aumentos variam entre 2,75€ e 10,40€.
Uma ida às urgências custa agora 15€ em Urgência Básica, 17,50€ em Urgência Médico-Cirurgica e 20€ em Urgência Polivalente. A estes valores acrescem as taxas moderadoras de meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) realizados no decurso do atendimento até um máximo de 50 euros. Uma ida aos Serviços de Atendimento Permanente custa 10€, mais 6,20€ do que em 2011 e uma sessão em Hospital de Dia pode chegar aos 25€, correspondendo ao valor das taxas moderadoras aplicáveis aos MCDT realizados no decurso do atendimento. Cada consulta de especialidade custa 7,50€ e as consultas de enfermagem passam a ser pagas, tendo um custo de 5€ nos hospitais e 4€ nos Centros de Saúde. Uma ida ao médico de família é agora 5€ e as consultas no domicílio passaram de 4,80€ para 10€.
Existem, de facto, algumas possibilidades quando surgem situações de urgência/emergência. No entanto, todas culminam numa única opção. Pagar. O transporte, as consultas, os meios de diagnóstico, os tratamentos e, claro, a conta na farmácia. Salvo algumas excepções, tudo é pago na totalidade por um utente do Serviço Nacional de Saúde não considerado em situação de insuficiência económica, ou seja, com um rendimento acima de 628,83€.

 

Cuidados Primários

Não faltam médicos de família, faltam horas de atendimento. É a conclusão de uma análise simples tendo apenas em conta o número de clínicos que prestam serviço em cada localidade da área de influência do jornal Abarca. No entanto, se considerarmos o facto de o mesmo médico ser contabilizado tantas vezes quantas os locais onde exerce, o cenário fica bastante aquém do desejável uma vez que possivelmente já não será possível os clínicos aumentarem as horas semanais de atendimento.
De acordo com as imposições legais e seguindo os critérios da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) o desejável traduz-se na existência de um médico por 1500 habitantes, seis horas de atendimento semanal por 500 utentes, 30 minutos de distância até à extensão de saúde mais próxima e dois centros ou extensões de saúde com médico por 100 km2. Das 65 freguesias que integram a área de influência do jornal Abarca, 38 contam com menos de 1500 residentes e apenas oito têm mais de 100 km2 de área.
Actualmente, e contabilizando um médico tantas vezes quantas os locais onde exerce, existem 100 clínicos distribuídos por 1272 horas de atendimento por semana em 50 centros e extensões de saúde. Mas, considerando os critérios anteriormente referidos numa análise por concelho, a área de influência do jornal Abarca precisaria de um total de 82 médicos de família, 1465 horas de atendimento por semana e 72 centros ou extensões de saúde. Assim, cada clínico exercia, em média, 18 horas por semana, em alguns casos, distribuídas pelas várias extensões de saúde de cada concelho de acordo com o número de utentes. Refira-se que um médico de Medicina Geral e Familiar pode ter um horário semanal de 35 ou 42 horas semanais e são precisamente as horas de atendimento semanal que apresentam a maior diferença entre o existente e o desejável. Considerando seis horas de atendimento semanal por 500 utentes, a região precisa de mais 324,5 horas distribuídas por Abrantes (100,5), Entroncamento (182), Ponte de Sor (29) e Sardoal (7).
Relativamente aos centros ou extensões de saúde, o Instituto de Gestão Informática e Financeira da Saúde contabilizava, em 2005, mais 12 extensões de saúde activas que somando às dez actualmente existentes sem médico perfaz um total de 22, exactamente a diferença entre o existente e o desejável. No entanto, os concelhos onde foram extintas unidades de saúde não coincidem com todos onde, dizem os números, faltam extensões. Foram extintas três extensões de saúde em Abrantes e na Chamusca, duas em Vila de Rei e no Gavião e uma no Sardoal e em Ponte de Sor. Considerando dois centros ou extensões de saúde por 100 km2, faltam dez em Ponte de Sor, nove na Chamusca, duas em Abrantes, Gavião e Vila de Rei e uma no Sardoal. Mas transpor a estatística para o terreno não seria certamente viável até porque não se registam casos onde são excedidos os 30 minutos de distância até à extensão de saúde mais próxima.

No terreno

São dez as extensões de saúde que funcionam apenas com serviço de enfermagem e em algumas localidades o atendimento médico é claramente insuficiente.
Em Abrantes, as extensões de saúde de Aldeia do Mato, Fontes, São Facundo, Barrada, Vale Zebrinho, Arreciadas, Souto e Vale das Mós não têm médico. O mesmo acontece em Alcaravela e Valhascos, no concelho de Sardoal. Em Montalvo, concelho de Constância, existe médico apenas oito horas por semana quando o ideal seria pelo menos 18. Na Chamusca existe apenas um médico para as freguesias de Ulme, Vale de Cavalos, Chouto e Parreira.
Os utentes das localidades sem médico são distribuídos pelas extensões de saúde mais próximas, existindo acordos entre as Juntas de Freguesia no que respeita ao transporte. Noutros locais com horário de atendimento insuficiente os utentes também acabam por optar em transferir a sua inscrição para outras extensões.
Mas, porque existem extensões de saúde com o número de médicos e horas semanais de atendimento exigidos de acordo com a população residente e mesmo assim não é fácil o utente marcar uma consulta? Os critérios da ERS não são os mais adequados? Os médicos não são eficientes? Os utentes usam e abusam dos serviços? Ou já estão sobrelotadas com os utentes obrigados a se deslocarem das freguesias vizinhas?

 

Cuidados Continuados

Para além de algumas Unidades de Cuidados na Comunidade, a área de influência do jornal Abarca conta com nove unidades de cuidados continuados integradas na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI). Para além da Unidade de Cuidados Paliativos, no Hospital de Tomar, existem outras unidades de internamento nas Misericórdias da Chamusca, Entroncamento, Vila de Rei e Ponte de Sor destinadas a pessoas com dependência funcional, doença crónica ou doença incurável em estado avançado e em fase final de vida.
A prestação de cuidados de saúde e de apoio social assegurada pela RNCCI pode ser requerida às Equipas de Gestão de Atlas existentes em cada hospital ou em qualquer Centro de Saúde e será facultada aos utentes através das unidades de internamento e de ambulatório e pelas equipas hospitalares e domiciliárias. Quaisquer custos que possam existir são calculados de acordo com a capacidade económica, podendo ser totalmente comparticipados pela Segurança Social.
Segundo o Relatório do Estudo do Acesso dos Utentes aos Cuidados Continuados de Saúde, publicado em 2011 pela Entidade Reguladora da Saúde, “a prestação de cuidados continuados de internamento cumpre com as normas da qualidade previstas”. Por outro lado, “a cobertura populacional estimada, considerando áreas de captação até meia hora de viagem em estrada em torno dos estabelecimentos e os dados de população residente, é de cerca de 96%, sendo que a população mais idosa, com idade igual ou superior a 65 anos, tem associada uma cobertura de aproximadamente 94%”.

 

Urgência e Emergência

Perante uma situação de urgência/emergência o que fazer? Os centros e extensões de saúde têm um horário específico e o atendimento médico é, em muitas situações, demasiado limitado.
Então, quais a opções? Em casos graves, ligar o 112, obviamente. Em situações menos graves, ligar para a Linha Saúde 24 ou dirigir-se a um Serviço de Atendimento Permanente (SAP) são duas possibilidades, mas a deslocação às urgências de um hospital acaba por ser sempre uma das opções mais viáveis.
O Hospital São João Baptista, no Entroncamento, disponibiliza um Serviço de Atendimento Permanente e o Centro Hospitalar Médio Tejo (CHMT) integra dois serviços de Urgência Básica (SUB) e um serviço de Urgência Médico-Cirurgica (MC).
Localizada na unidade hospitalar de Abrantes a MC tem à sua disposição uma Viatura Médica de Emergência e Reanimação (VMER). A equipa, constituída por um médico e um enfermeiro, dispõe de equipamento de Suporte Avançado de Vida para a estabilização pré-hospitalar e acompanhamento médico durante o transporte de vítimas de acidente ou doença súbita.
Relativamente às Urgências Básicas, situadas em Torres Novas e Tomar, cada uma detém uma ambulância de Suporte Imediato de Vida (SIV) que garante cuidados de saúde diferenciados, tais como manobras de reanimação. Para além de equipamento de Suporte Básico de Vida, dispõe ainda um monitor-desfibrilhador e diversos fármacos, sendo a tripulação composta por um enfermeiro e um técnico de ambulância de emergência.
Existem ainda as ambulâncias de Suporte Básico de Vida (SBV) para estabilização de doentes que necessitem de assistência durante o transporte para uma Unidade de Saúde. Estão sediadas em corpos de bombeiros e a sua tripulação é composta por técnicos de ambulância de emergência.
A Linha Saúde 24 pode ser uma alternativa em algumas situações, estando acessível, 24 horas por dia, através do número 808 24 24 24, cujo custo é o equivalente a uma chamada local. O atendimento disponibiliza aos utentes o acesso a um profissional de saúde que avalia o nível de risco sobre os sintomas descritos, presta aconselhamento, incluindo o auto tratamento e, caso se verifique necessário, encaminha o doente para o serviço de saúde mais adequado à sua condição do momento. Este serviço telefónico presta também apoio em matérias de aconselhamento terapêutico, saúde pública e informação geral relacionada com a temática da saúde e serviços de saúde.

 

Cuidados Hospitalares

Cobertura

À excepção do concelho da Chamusca, que tem como referência o Hospital Distrital de Santarém, a área de influência do jornal Abarca é servida pelo Centro Hospitalar Médio Tejo (CHMT) que integra as unidades de Abrantes, Torres Novas e Tomar.
No entanto, verificam-se alguns concelhos abrangidos por mais de um hospital. Para além do CHMT, Mação e Vila de Rei também têm como hospital de referência a unidade de Castelo Branco, Gavião e Ponte de Sor a unidade de Portalegre e Entroncamento a unidade de Santarém.
Refira-se ainda que a área de influência do jornal Abarca conta também com o Hospital São João Baptista, no Entroncamento, um hospital misericórdia com financiamento público e convenção com o Serviço Nacional de Saúde.

Proximidade

Embora o concelho da Chamusca tenha como referência o Hospital Distrital de Santarém, apenas Parreira e Vale de Cavalos se encontram mais próximas desta unidade. As restantes cinco freguesias conseguem ganhar alguns minutos se se deslocarem a Torres Novas.
Segundo o Estudo de Avaliação dos Centros Hospitalares, divulgado em 2012, pela ERS, o CHMT detém um índice de proximidade elevado face à população abrangida, sendo que em situações de emergência o tempo médio de viagem é inferior a 25 minutos.
Um cenário bem diferente para quem precisa de se deslocar para uma consulta já marcada ou simplesmente para visitar um doente. Avaliando todos os hospitais referenciados para cada um dos onze concelhos da área de influência do jornal Abarca concluímos que a distância temporal numa viagem de carro em trajectos sem portagens pode chegar a cerca de duas horas.

Capacidade e acesso

O CHMT regista um rácio de 1,4 médicos e 3,3 enfermeiros por 1000 habitantes, valores abaixo da média nacional (3,7 e 5,7) e muito aquém da média europeia (3,3 e 9,8) de acordo com a ERS.
No entanto, existe excesso de médicos em algumas especialidades. Segundo o relatório das “Actuais e Futuras Necessidades Previsionais de Médicos (SNS)”, apresentado pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), em 2011, existem mais médicos do que o desejável em Cardiologia, Cirurgia Geral, Anestesiologia, Ortopedia, Gastrenterologia e Cirúrgia Plástica Reconstrutiva. Um excesso de 42 clínicos por um lado, mas a necessidade de mais 48 médicos por outro. Pressupondo que não haja recurso a horas extraordinárias ou a contratação de empresas prestadoras de serviços médicos e contabilizando apenas os médicos já detentores do grau de especialista, o documento conclui também que o CHMT precisa de mais especialistas em Medicina Interna, Ginecologia/Obstetrícia, Dermatovenereologia, Anatomia Patológica, Neurologia, Oftalmologia, Otorrinolaringologia, Psiquiatria, Infeccilogia, Nefrologia, Pneumologia, Reumatologia e Urologia.
Relativamente ao acesso aos cuidados hospitalares regista-se uma acentuada redução comparando Janeiro de 2012 a Agosto de 2011. Em seis meses as idas às urgências do CHMT diminuíram 89% (- 117.050) e o número de sessões em Hospital de Dia decresceu 92% (- 7.010). Também as consultas externas contam com menos 96.985 (86%) atendimentos e verificam-se menos 5.550 (88%) intervenções cirúrgicas.

 

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